domingo, 23 de outubro de 2016

NÃO HÁ VAGAS (POEMA DE FERREIRA GULLAR)

O preço do feijão
não cabe no poema. O preço
do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar 
do pão

O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.
Como não cabe no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras

_ porque o poema, senhores
está fechado:
"não há vagas"

Só cabem no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço

O poema, senhores,
não fede
nem cheira 

GULLAR, Ferreira.Toda poesia. Rio de Janeiro: José Olympio, 1991. p. 162. In: AMARAL, Emília...[et. al.] Novas Palavras. 3º ano. 2. ed. São Paulo: FTD, 2013. p. 166

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